sábado, março 02, 2013

O testamento do Papa Bento XVI - Anselmo Borges «» Cabras a cantar são nova sensação do YouTube

Agora, é apenas Papa emérito. Mas que ninguém se preocupe com os dois Papas vivos, pois Ratzinger retirou-se, para rezar, meditar, ouvir e tocar música, investigar, "desaparecendo" para o mundo.
Joseph Ratzinger também teve o seu momento de rebeldia e de progressismo, no Concílio Vaticano II. Chegou a dizer nas aulas, em Tubinga: "em Roma, como sabem, não se faz boa Teologia." Durou pouco tempo esse tempo. A sua orientação teológica agostiniana - Santo Agostinho não tinha em muito boa consideração o mundo - inclinava-o mais para uma visão conservadora. A mudança teve como ponto decisivo os excessos de 1968, com o radicalismo ateu dos estudantes de Teologia.
Reconhecido pela sua inteligência brilhante e uma rara cultura - dialogou com grandes intelectuais, incluindo Jürgen Habermas -, é mais um intelectual e um professor do que um pastor. As circunstâncias quiseram que este homem afável, tímido, "honesto, íntegro e encantador no trato pessoal", como reconhece também o teólogo J. I. González Faus, deixasse a vida académica, se tornasse arcebispo de Munique, seguisse para Roma como "inquisidor", condenando muitas dezenas de teólogos e a Teologia da Libertação, e se tornasse Papa - quando aconteceu a eleição, lembrou-se da guilhotina.
Deixa três encíclicas: a primeira, para dizer que a verdadeira "definição" de Deus é que é Amor; a segunda, para convocar os cristãos e todos os homens à esperança; a terceira é sobre "a caridade (o amor) na verdade". Nela, condena as posições neoliberais, cujo único objectivo é o lucro; reafirma a doutrina essencial de que a economia e o desenvolvimento só são verdadeiros se estiverem ao serviço do homem todo e de todos os homens; que, em ordem ao seu correcto funcionamento, a economia precisa da ética, "uma ética amiga da pessoa"; que, para conseguir o governo da economia mundial, o desarmamento, a segurança alimentar e a paz, a salvaguarda do meio ambiente e a regulação dos fluxos migratórios, "urge a presença de uma verdadeira Autoridade política mundial, que deverá ser reconhecida por todos, gozar de poder efectivo para garantir a cada um a segurança, a observância da justiça, o respeito dos direitos".
Ideia nuclear é a do diálogo entre a fé e a razão. A fé, sem a razão, é cega e intolerante; a razão, sem a abertura à transcendência, pode enlouquecer. No cristianismo, acolhe-se a fé, dando lugar à descoberta do "Deus que é Razão criadora e ao mesmo tempo Razão-amor". Aí está o vínculo indissolúvel entre Razão, Verdade e Bem.
Na Sexta-Feira Santa de 2005, ainda cardeal, disse aquelas palavras: "quanto sujidade na Igreja! A traição dos discípulos fere mais Jesus." Referia-se certamente ao escândalo da pedofilia, à figura sinistra do padre Maciel, fundador dos Legionários de Cristo, ao que se passava na Cúria. Quando assumiu funções, foi exemplar, pondo Maciel fora da vida pública, pedindo perdão às vítimas da pedofilia e tomando medidas drásticas e consistentes, para que os crimes se não repitam.
Não conseguiu reformar a Cúria nem pôr termo às intrigas, ao carreirismo, às lutas pelo poder, aos escândalos, desde a corrupção à lavagem de dinheiro no Banco do Vaticano e ao Vatileaks. Sem forças "no corpo e no espírito", renunciou, "em consciência e plena liberdade", para que outro lhe suceda.
Foi talvez a lição maior de Joseph Ratzinger enquanto Papa. Houve quem o criticasse, também dentro da Igreja e pensando em João Paulo II: que não se desce da Cruz e que dessacralizou o papado. Mas, afinal, o Papa é mais do que um homem? Não se trata tão-só de um cristão que leva consigo a específica missão gigantesca de ser sinal e promotor de unidade entre os cristãos e a Humanidade?
Este é o seu testamento: abandona pacificamente o poder. Porque na Igreja, como aliás no mundo em geral, é preciso escolher entre o poder como dominação e a força do serviço. O Deus cristão não se revela como Poder-Dominação, mas Força Infinita de criar no Amor. Bento XVI leu e recomendou que todos os Papas lessem a famosa carta de São Bernardo ao Papa Eugénio III: "Não pareces um sucessor de Pedro, mas de Constantino."





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RUY VENTURA:::
Palavras que perturbam
“[…] quando o Filho do Homem voltar,
encontrará a fé sobre a terra?”

Jesus de Nazaré (Lucas, 18: 8)

         No Natal de 1969 um jovem professor de Teologia, com pouco mais de quarenta anos, proferiu na Emissora Radiofónica de Hessis uma conferência que, hoje, podemos considerar profética. A prelecção intitulava-se “Que aspecto será o da Igreja no ano 2000?” e, a dado passo, afirmava:
         “Da crise de hoje […] nascerá amanhã uma Igreja que terá perdido muito. Tornar-se-á mais pequena, terá em larga medida de recomeçar tudo de novo. Essa Igreja não vai poder encher muitos dos edifícios que construiu quando a conjuntura era favorável. Com a perda do número de seguidores, perderá também muitos dos seus privilégios na sociedade. Terá de se apresentar de modo muito mais forte do que até aqui, como uma comunidade de voluntariado, a que só se pode aceder por decisão. Enquanto pequena sociedade, vai exigir de modo muito mais marcante a iniciativa dos seus membros. […] Será uma Igreja interiorizada […]. Não terá uma vida fácil. Porque este processo de cristalização e clarificação custar-lhe-á alguns bons colaboradores. Torná-la-á pobre e fará dela uma Igreja dos pequeninos. O processo será tanto mais difícil por a Igreja ter de eliminar tanto a tacanhez sectária como a bravata daqueles que só querem fazer a sua vontade. […] preparam[-se] tempos muito difíceis para a Igreja. § A autêntica crise mal começou. Deve-se contar com grandes abalos […]”
         A autêntica crise mal começara… É possível que o autor destes trechos, retirados de um livro intitulado “Fé e Futuro”, tenha pensado na sua afirmação quando, em Abril de 2005, lhe coube dirigir em Roma a Via Sacra de Sexta-Feira Santa. Meditando a partir da terceira queda de Jesus Cristo a caminho do Calvário, proferiu palavras duras, cortantes:
         “Tantas vezes celebramos apenas nós próprios, sem nos darmos conta sequer d’ Ele! Quantas vezes se contorce e abusa da sua Palavra! Quão pouca fé existe em tantas teorias, quantas palavras vazias! Quanta sujeira há na Igreja, e precisamente entre aqueles que, no sacerdócio, deveriam pertencer completamente a Ele! Quanta soberba e auto-suficiência. […] Senhor, muitas vezes a vossa Igreja parece-nos uma barca que está para afundar, uma barca que mete água por todos os lados. […] O vestido e o rosto tão sujos da vossa Igreja horrorizam-nos. Mas somos nós mesmos que os sujamos! Somos nós mesmos que Vos traímos sempre, depois de todas as nossas grandes palavras, os nossos grandes gestos. […].
         O homem que tal disse era Joseph Ratzinger. Dias depois sucederia a João Paulo II como papa e escolheria, significativamente, o nome de Bento. O pastor que pensou e difundiu o diagnóstico que nos perturba só poderia confirmá-lo e aprofundá-lo em 2013, dias depois de anunciar “urbi et orbi” a sua renúncia ao sólio pontifício por razões que, totalmente, só ele e Deus conhecerão. Na homilia de Quarta-Feira de Cinzas sublinharia quão importante é “o testemunho de fé e de vida cristã de cada um de nós e das nossas comunidades para manifestar o rosto da Igreja; rosto este que, às vezes, fica deturpado.” E explicou: “Penso de modo particular nas culpas contra a unidade da Igreja, nas divisões no corpo eclesial. Viver a Quaresma numa comunhão eclesial mais intensa e palpável, superando individualismos e rivalidades, é um sinal humilde e precioso para aqueles que estão longe da fé ou são indiferentes.
         Todas estas palavras, dirão, têm apenas interesse para os católicos que, agora, esperam a eleição do seu novo líder religioso, depois da decisão inesperada e raríssima de um alemão que decidiu abdicar do lugar em que fora investido, dizem, pelo Espírito Santo. Assim não creio. Se o nosso objectivo é trabalharmos para que se diluam – como propôs Bento XVI – as relações de tolerância mútua em benefício da construção de uma comunidade de seres benevolentes, ou seja, se queremos transformar uma sociedade de indiferença entre os seres num mundo centrado no bem de cada ser humano, estas palavras não podem deixar-nos indiferentes – se olharmos para quanto nos rodeia de uma perspectiva sagrada e sacralizadora, seja qual for a nossa postura perante Deus.
         Perturbado pelas palavras que transcrevi e por quanto têm de verdadeiro neste mundo em que tudo vale e tem o mesmo valor, dei por mim a pensar num dos célebres frescos de Giotto di Bondone, existentes na Basílica de São Francisco, em Assis. Do lado direito, temos um papa (Inocêncio III, 1198-1216) que sonha. Do outro, a representação do sonho: São Francisco impede a derrocada de uma catedral, ou seja, da Igreja por inteiro. Eram tempos conturbados aqueles… como os nossos. A santidade de Francisco impediu a queda. E agora?
         Tentando aliviar a perturbação, peguei num livrinho do filósofo russo Nicolai Berdiaeff, cristão ortodoxo defensor da unidade das Igrejas, perseguido pelos comunistas, leitor e admirador das obras do nosso Teixeira de Pascoaes. Nesse opúsculo intitulado “Da Dignidade do Cristianismo e da Indignidade dos Cristãos” reproduz uma história que me dá que pensar sempre que a leio. Saiu da mão de Boccacio, escritor medieval italiano.
         Um cristão tentava há muito converter um amigo judeu. O baptismo do israelita estava à porta. Quis contudo, antes de dar o passo definitivo, ir a Roma apreciar a conduta da Cúria e do pontífice. O católico, que tanto trabalhara, viu as suas expectativas irem por água abaixo.         “O judeu partiu e constatou a hipocrisia, a depravação, a corrupção, a cupidez que reinavam nessa época na corte do Papa entre o clero romano. Voltou – e o seu amigo cristão logo lhe perguntou com inquietação que impressão trazia de Roma. A resposta, com um sentido muito profundo, foi das mais inesperadas: se a fé cristã nunca foi abalada por todos os escândalos e abominações que havia visto em Roma e se, apesar de tudo, ainda se fortificava, ela deveria ser a verdadeira fé. O israelita tornou-se assim cristão.
         É preciso separar, nestes tempos de “fulanização”, a exigente doutrina nascida nas e das palavras de Jesus Cristo do modo impuro, fanático, interesseiro e/ou depravado com que muitos cristãos a vivem, distinguir o Cristianismo (nas suas diferentes vias) da hipocrisia anticristã daqueles que apontam o argueiro mas escondem a tranca que têm sobre a cabeça. Sabendo que os cristãos vivem em direcção a uma meta de perfeição, sem serem seres perfeitos, é preciso denunciar aqueles que, diabolicamente talvez, querem uma Igreja tacanha de “puros” e fecham portas quem nem eles próprios sabem abrir. Mas, ao mesmo tempo, devemos impedir o crescimento de um Cristianismo de trazer por casa, à la carte, sem criação, sem altitude, sem mistério, sem espiritualidade, sem sacralidade e sem compaixão.
         Berdiaeff sublinha: “Não é culpa de Cristo se a sua verdade não se cumpre nem se realiza na vida. Cristo não é responsável se os Seus mandamentos são espezinhados.” O próximo papa, com as suas insuficiências e com humildade, deve contribuir, como Francisco de Assis, para que o Cristianismo se mantenha de pé, como proposta de elevação e salvação do ser humano. É a sua tarefa – e a tarefa de todos os cristãos e homens de boa vontade.
RUY VENTURA (Portalegre, 1973).
Mais dados em: www.ruyventura.blogspot.com



O último papa? Vejamos a profecia e os sucessores papais »

 exegeseoriginal.blogspot.pt/2013/02/



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